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segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Besouro, espírito de bravura

Já haviam se passado quase quarenta anos depois da abolição da escravatura e os negros continuavam a viver em situações desumanas. A capoeira, proibida, era a válvula de escape destas pessoas que ainda sofriam com uma série de restrições. Esse é o contexto do filme Besouro, que entrou em cartaz nos cinemas de todo o Brasil, inclusive em Niterói, no último dia 30 de outubro. A história se passa nos anos 20, no Recôncavo Baiano e é inspirada em fatos reais. Manoel Henrique Pereira, o Besouro, se tornou um mito e um símbolo da luta do reconhecimento da cultura dos negros no Brasil.
A história da Capoeira começa já no século XVI, quando Portugal começou a trazer negros da África pra trabalharem como escravos. Eles trouxeram de seu continente natal sua cultura e suas danças. O início da capoeira consistia em uma forma de luta que afirmava a cultura negra e os direitos dos escravos libertos. Mas, no Brasil, eles eram proibidos por seus patrões de praticar qualquer tipo de luta. Assim, uniram suas danças típicas a uma espécie de arte marcial e começaram a inventar a capoeira mais parecida com a forma com que ela é conhecida atualmente, uma luta misturada com dança. Por meio dessa necessidade de se unir dança e luta é que a capoeira hoje é a única arte marcial que se pratica acompanhada de música. A música determina o ritmo e o estilo do jogo na roda de capoeira. Ela varia em letra e ritmo. A música “Cavalaria”, por exemplo, era usada para avisar a quem participava da roda que a polícia estava chegando. O filme retrata bem esta realidade, com diversas cenas de retaliações de todo tipo por parte dos patrões que descobriam os negros se divertindo desta forma.
A prática deste misto de esporte e dança ficou proibida no Brasil até 1930, pois era considerada violenta. Nesse ano, porém, um famoso capoeirista, de nome Manuel dos Reis Machado, o Mestre Bimba, fez uma apresentação para Getúlio Vargas. O presidente adorou e transformou a capoeira em esporte nacional brasileiro. Em 1932, Mestre Bimba abriu a primeira escola de capoeira do Brasil, em Salvador, que teve como nome "Centro de Cultura Física e Capoeira Regional da Bahia". Ele criou o primeiro método de ensino da capoeira, que auxilia os alunos a desenvolver os movimentos fundamentais do jogo. Foi com ele que a capoeira passou a ser ensinada em recinto fechado. Uma outra curiosidade sobre este capoeirista é que ele abriu sua primeira escola de capoeira em Angola, no ano de 1918, com apenas 18 anos de idade. Mestre Bimba é considerado o pai da capoeira moderna.
O jogo é caracterizado por golpes e movimentos ágeis e complexos, utilizando os pés, as mãos, a cabeça, os joelhos e os cotovelos. No filme Besouro há ainda a presença dos vôos, já que uma das lendas sobre este capoeirista afirma que ele tinha a capacidade mágica de voar. Existem dois tipos de capoeira, a Angola e a Regional. A Angola assemelha-se mais ao estilo de jogo dos escravos. Nela, os rituais afro-brasileiros estão mais presentes. Seu maior representante foi Vicente Joaquim Ferreira, o Mestre Pastinha. Já a Regional foi criada pelo Mestre Bimba. Esse tipo de capoeira tem uma maior presença de características das artes marciais. O forte da capoeira regional são as quedas, rasteiras e cabeçadas. Quanto à música, o principal instrumento é o berimbau, seja qual for o tipo de capoeira, Angola ou Regional. Porém, há também o pandeiro, o atabaque, entre outros.

Atualmente, a capoeira tem o objetivo principal de manter as tradições. Quando se fala de praticantes sérios nos tempos atuais, a capoeira tem como foco ser um exercício físico e mental e seus golpes são apenas simulados. Ela se tornou um esporte competitivo, de acordo com uma resolução de 1972 do Conselho Nacional de Desportos. E a lenda de Besouro é muito conhecida nestas rodas, que tem este capoeirista como ídolo. Antônio Carlos de Menezes, o Mestre Burguês, é presidente do grupo Muzenza, que está presente em 25 estados do Brasil e mais outros 35 países. Ele deu a sua opinião sobre o filme, no site oficial do grupo: “O Besouro sempre foi um ídolo dos capoeiristas, principalmente nós do Grupo Muzenza, que vemos nele um espírito de bravura, um capoeirista que foi sempre honesto e único no jogo da capoeira. Por onde eu passo, Angola, África do Sul, Europa, todos só falam deste filme”. Ele ainda afirma que "praticar capoeira, é uma das formas mais simples de expressar o desejo de ser livre nos movimentos, e de ser brasileiro de fato".
Isaac da Cruz tem 22 anos e pratica capoeira desde os dez. Segundo ele, “a capoeira completa meu físico e mental e me faz ter a sensação de estar relaxado”. Ele assistiu ao filme Besouro, mas não gostou muito da associação do esporte com o espiritismo: “No filme entende-se que para ser capoeirista tem que ser espírita, entregando-se aos orixás, mas não é bem assim. Para ser capoeirista basta apenas se dedicar ao esporte, respeitando a todos e sendo humilde”.
Com opiniões a favor ou contra o filme, o que interessa é que ele mostra um pouco de como era o passado da capoeira. O que antes era negado aos negros e visto como algo violento, hoje é reconhecido como fundamental na cultura brasileira. Assim como o samba e o futebol, a capoeira leva o nome do Brasil por onde passa. Besouro com certeza ficaria orgulhoso de ver tudo isso.  

Site oficial do filme: http://www.besouroofilme.com.br/ Neste site você pode ver o trailer oficial do filme, além de saber mais sobre a criação deste longa metragem.

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